“E se acaso for o homem que da mulher apanhar, violncia domstica, voc pode me explicar? Tudo pode acontecer no mbito familiar, mas nesse caso diferente, a lei bastante clara por ser uma questo de gnero, somente a mulher ampara. Se a mulher for valente, o homem que livre a cara”. Este o trecho deA Lei Maria da Penha em Cordel, do artista cearense Tio Simpatia, citado pelo juiz paranaense Marcelo Quintin durante o julgamento de uma ao no qual o marido queria indenizao e medida protetiva contra a esposa. Quintin usou o trecho para embasar sua sentena, na qual negou a aplicao da Lei Maria da Penha, em 2019.
“Apesar de ser uma pea artstica e cultural do Brasil, o Cordel trata de forma detalhada e traz informaes jurdicas. E a eu pensei que poderia levar aquela mensagem deforma mais fcil pro jurisdicionado. Eu citei o trecho que trata de o homem no poder ser escorrido pela Lei Maria da Penha e a a gente explica que h a proteo de determinado segmento da sociedade por ter isonomia, de se agir de forma desigual para trazer a verdadeira equidade”, explicou o juiz.
Segundo ele, basta trabalhar em uma vara criminal do pas para saber que a maioria absoluta dos crimes que ocorrem no Brasil hoje de violncia domstica. Para o magistrado, muitas vezes a sociedade tenta levar essa questo para o lado biolgico ou para um segmento poltico, mas a realidade brasileira a de mulheres que sofrem violncia todos os dias. “Basta visitar uma vara criminal e saber que isso verdade. Todas as campanhas que se fizerem a respeito desse assunto so muito bem-vindas e ns estamos justamente no Agosto Lils, que lembra essa questo. Todas as iniciativas so de extrema importncia”, ressaltou.
Quintin contou que na poca em que preferiu a deciso citando cordel, recebeu muitas crticas de homens que o questionavam sobre a no existncia de leis que os protejam em situaes de violncia domstica. Segundo ele, necessrio lembrar que o homem tem proteo na legislao comum, do Cdigo Penal e de outras leisque j existem. “Mas por conta dessa desigualdade ftica que enfrentamos diariamente de mulheres vtimas todos os dias, temos uma lei especfica e protetiva desse segmento social.
O juiz destacou que de 2019 para c houve melhorias na lei, como a punio para o crime de perseguio, tambm conhecido comostalker, para a violncia psicolgica. Tambm houve melhorias nas campanhas feitas por diversas entidades da sociedade civil. “Mas o que ns precisamos efetivamente de maior fiscalizao e maior atendimento s vtimas de violncia domsticaque esto nos rinces do pas, naquelas cidades do interior, em cidades onde o o s autoridades e aos seus direitos propriamente ditos fica dificultado. Nesses lugares mais distantes onde vemos ocorrercom mais frequncia violnciade ares medievais contra mulheres”, afirmou Quintin.
De acordo com o juiz, apesar de ter penas previstas na lei, a frequncia dos feminicdios em casos de violncia domstica muito maior do que os crimes de homicdio em outros campos. Ele acredita que se no houver uma ao rpidapara tentar parar a violncia domstica no seu incio, quando ainda est no estgio da ameaa psicolgica ouperseguio, o segundo estgio j ser de violncia fsica.
“Se ns no estancarmos essa violncia logo no incio, ela vai se graduando de forma a chegar a um feminicdio. So vrias as ocasies em que isso acontece na vida real e nos deixa entristecido. Eu tive ocaso de um agressor que, no incio, ameaava e fazia crimes mais leves. Acabou que ele tentou matar a companheira, foi a julgamento, recebeu uma pena muito leve, foi solto em duas semanas e consumou o homicdio que havia tentado l atrs. Isso acontece com frequncia gigantesca, infelizmente”.